O QUE É ESCREVER
O fim, a finalidade de escrever? Para além ainda de um devir-mulher,
de um devir-negro, animal etc., para além de um devir-minoritário, há o
empreendimento final de devir-imperceptível. Não, um escritor não pode
desejar ser "conhecido", reconhecido. O imperceptível, caráter comum da
maior velocidade e da maior lentidão. Perder o rosto, ultrapassar ou furar o
muro, limá-lo pacientemente, escrever não tem outro fim. O que Fitzgerald
chamava de verdadeira ruptura: a linha de fuga, não a viagem nos mares
do Sul, mas a aquisição de uma clandestinidade (mesmo se se deve tornarse
animal, tornar-se negro ou mulher). Ser, enfim, desconhecido, como
poucas pessoas são, é isso trair. É muito difícil não ser mais conhecido de
ninguém, sequer do porteiro, ou no bairro, o cantor sem nome, o ritornelo.
(...)
G. Deleuze e C. Parnet in Diálogos
Nenhum comentário:
Postar um comentário