terça-feira, 6 de março de 2018

SOBRE A FORMA DA ÁGUA


Claro que não se deve buscar mensagens nas obras de arte. Elas nascem da criatividade entrelaçada com o subconsciente, e significam tudo e nada. Ou dizem o que cada um precisa escutar. Assim é o filme A Forma da Água, de Guillermo del Toro, ganhador do Oscar de melhor filme, que contém muitas leituras, talvez por ser considerado “simples”, quase um conto de fadas, uma pequena história de amor. Será só isso?
Eu, por exemplo, li a obra como um mundo de silêncios. Não só porque a protagonista é muda, mas sim porque parece ignorar a linguagem do nosso mundo atual. Ou será que ela quis justamente desmascarar a sociedade do ruído, da pós-verdade, das notícias falsas ou ambíguas, a sociedade do grito, do desencanto e do amor perdido, a sociedade que teme ou odeia o diferente? A Forma da Água parece querer desafiar uma sociedade que na superfície se revela ansiosa pelo complexo e ambíguo, pela hemorragia das palavras, pela violência gratuita, mas que ao mesmo tempo parece desejar a cada dia mais o fascínio do simples e do genuíno. Volta-se a fazer pão em casa, cresce a prática da meditação, do silêncio perdido. E, sobretudo, a busca por um pouco de amor que seja só amor.
(...)

Juan Arias, El País,05/03/2018, 20:09 hs

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