quarta-feira, 5 de junho de 2019

O DELÍRIO 

O delírio é um tema "visceral" em psicopatologia clínica. Há dois elementos, entre outros, que o fazem tão importante. Em primeiro lugar, por tocar a questão da verdade. Isso leva à pergunta: "o que o paciente diz remete a uma verdade?" Em segundo, porque tal discurso (se delirante) conduz a situações de maior ou menor constrangimento social, já que o dizer remete a um fazer. O delirante tende a incomodar. Então, a verdade do paciente nem sempre é a verdade do que está em torno, o que não é mais do que a sociedade com seus equipamentos de avaliação moral, violência, disciplina e controle. Sim, é um tema que extrapola os limites da clínica exatamente por dizer UMA verdade que não é A verdade, bem entendido, a verdade das instituições sociais. No miolo de tal paradoxo, a multiplicidade dos discursos (amoroso, político, religioso, filosófico, científico, midiático, poético, etc) se espraia em configurações subjetivas com implicações diretamente práticas. É aí no âmbito mesmo da psiquiatria clínica, em situações-limite de urgência/emergência, que a questão de delírio se põe e se expõe no cara a cara do real-concreto:"o que fazer?" Em suma, falar sobre o delírio permite "delirar" as multiplicidades do mundo, mas há uma hora em que é inadiável uma escolha ética como condição para a intervenção técnica. 


A.M.

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