Devires
Antonio Moura
O paciente vive entristecido pela Grande Máquina. Sua alegria foi aniquilada em plena vigília. Do nada. Ninguém assume a autoria dos pequenos crimes. Eles são administrados em nome da paz de espírito. Ora, o espírito também caga. Avise aos últimos palhaços que a arte foi solapada em nome do ideal dos homens de branco. Ao que me consta, nada mudou no sulco das bocas. Elas falam rachando dentes. Mastigam auroras nati-mortas. Mas o Rosto carrega uma expressão justa, como negar? A bondade natural dos humanos. Ó Lovecraft, socorrei! Apenas uma cidade respirando um arco-íris, manda por favor... Não falo por mim. Por mim, ó... Falo pelo que não sou, falo por devires. Escutai a canção do mundo... Você dança? O paciente sucumbe à Ordem. Por favor, o senhor pode me dizer as horas? Já vai tarde o tempo dos mestres, com todo o respeito. Sonâmbulos da própria dor, como falar aos que não falam? A Grande Máquina é uma pequena dose de benefícios a curto e médio prazo. Ela se insinua na febre dos corredores infectos. Um susto, um sus. Tudo é contágio. Resistir à morte, querida, e fazer dessa vibração algo novo, será possível? Talvez um devir-amante imerso em trepadas millerianas. Bicho, perdoa o jeito canino: o que é necessário para viver por viver? Pacientes são pacientes demais. Armaduras químicas, lições de casa, manuais de sobrevivência, coisas simples, eles são normais. Eu queria um gosto de sol em você, em suas dores mais intensas e irremediáveis. Pena que a sombra dos quintais do passado anuncie sessões de tortura regadas à dinheiro. A entrega é às oito. Todos estarão lá, até o chefe da Facção Sinistra, aquele mesmo que começou a seduzir a multidão com truques de falar macio. Não tem jeito. Somos inocentes radicais.
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