Março de 2012 - Vol.17 - Nº 3
COLUNA PSIQUIATRIA CONTEMPORÂNEA
BERTALANFFY...PRIGOGINE...KENDLER: SOB A MESMA FLECHA DO TEMPO?
Guilherme Luiz Lopes Wazen
Preceptor do ambulatório de Transtornos do Humor, Departamento de Psiquiatria e Psicologia Médica, Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto (FAMERP); membro do NUTTEC (Núcleo Transdisciplinar para Estudo do Caos e Complexidade)
Moacir Fernandes de Godoy
Coordenador do NUTTEC (Núcleo Transdisciplinar para Estudo do Caos e Complexidade).
Resumo – Os autores discutem a proposta de Kendler para o entendimento da doença mental com uma abordagem multifatorial, baseada em múltiplos níveis de interação interagentes por meio de retroalimentações que unem realidades biológicas, psicológicas e sociais.
Ludwig von Bertanlanffy iniciou sua carreira como biólogo em Viena, na década de 20, aonde logo juntou-se a um grupo de cientistas e filósofos conhecido como Círculo de Viena. Assim como com outros biólogos organicistas, acreditava que fenômenos biológicos exigiam uma nova maneira de pensar, transcendendo os métodos tradicionais das ciência físicas. Estabeleceu então sua teoria geral dos sistemas sobre uma sólida base biológica e apontou um dilema que intrigava os cientistas desde o século XIX: enquanto a mecânica newtoniana era uma ciência de forças e trajetórias, o pensamento evolucionista exigia uma nova ciência, a ciência da complexidade (Davidson, 1983).
A primeira formulação dessa nova ciência foi a termodinâmica clássica com sua segunda lei (lei de dissipação de energia). Formulada por Sandi Carnot esta postulava uma tendência nos fenômenos físicos para a desordem. Qualquer sistema físico isolado se encaminhará espontaneamente em direção de uma desordem sempre crescente. Para expressar essa direção na evolução dos sistemas físicos em forma matemática foi introduzida então uma nova quantidade denominada entropia. De acordo com a segunda lei, a entropia de um sistema físico isolado continuará sempre aumentando. Seria então a entropia considerada como uma medida de desordem. Neste exato momento um ponto de interrogação foi criado entre as concepções de um mundo desdobrando-se em direção à ordem e complexidade, com a de um motor que para de funcionar, num mundo de desordem sempre crescente. Bertalanffy reconheceu que sua concepção por lidar com sistemas abertos não funcionaria sob o regime da termodinâmica clássica, pois nos sistemas abertos a entropia também poderia decrescer (Bertalanffy, 2009). Somente 30 anos depois, com o físico-químico russo Ilya Prigogine, a formulação de uma nova termodinâmica pode dar continuidade matemática às idéias de Bertalanffy (Capra, 2006).
Intrigado com o fato de organismos vivos serem capazes de manter seus processos de vida em condições de não-equilíbrio Prigogine enxergou a importância das equações não-lineares. Desenvolveu então uma nova termodinâmica não-linear que descreve o fenômeno de auto organização em sistemas abertos afastados do equilíbrio, onde a dissipação pode levar a uma nova ordem através de flutuações amplificadas por laços de realimentação positiva. Enfatizou também que as características de uma estrutura dissipativa não podem ser encaradas somente pelas propriedades de suas partes, mas são consequência de uma organização do sistema em si. No ponto de transição do equilíbrio para o não equilíbrio o sistema se comporta como um todo, emergindo então um novo padrão. Devido às iterações repetidas durante o processo qualquer variação ínfima pode tornar impossível qualquer previsão. Neste momento o paradigma mecanicista newtoniano totalmente causal e determinado dá espaço para a imprevisibilidade e probabilidade, onde o sistema estudado está regido sob uma verdadeira interação entre flutuações, mas ainda sob leis deterministas. (Prigogine, 2006). (grifos nossos)
O leitor neste momento deve estar se indagando: onde entra nossa Psiquiatria neste contexto? É visível o nosso uso de sistemas classificatório baseados em condições de pura linearidade, mas já foi demonstrado que o aparecimento de sintomas segue um padrão não-linear. O emprego do conceito de entropia (na forma de entropia aproximada- ApEn) em séries cardíacas e eletroencefalográficas já demonstraram padrões não identificados por medidas lineares quando relacionadas à psicopatologia (Pincus, 2003). Seguindo o mesmo raciocínio análises de EEG por meio da entropia demonstraram uma dinâmica diferenciada entre o pós e pré tratamento com antipsicóticos em esquizofrênicos, principalmente em córtex pré frontal (Takahashi et al, 2010). Seria então o momento de uma nova abordagem dentro dos constructos psiquiátricos? Talvez nomes ligados à formulação de uma nova nosologia psiquiátrica tenham se dado conta de tal fato, sendo Keneth Kendler um exemplo.
(...)
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