domingo, 20 de maio de 2012

O RESSENTIMENTO  E  SUAS  METÁSTASES

A impotência a admirar, a respeitar, a amar. A memória dos traços é raivosa por si mesma. A ira ou a vingança se escondem. Mesmo nas lembranças mais enternecedoras e mais amorosas, vê-se os ruminantes da memória disfarçarem essa ira por uma operação sutil, que consiste em reprovar a si mesmos tudo que, de fato, eles reprovam no ser cuja lembrança fingem adorar. Por essa mesma razão devemos desconfiar daqueles que se acusam do que é bom ou belo, pretendendo não compreender não serem dignos: sua modéstia dá medo. Que ódio do belo se oculta em suas declarações de inferioridade (...) (...) O mais surpreendente no homem do ressentimento não é sua maldade e sim sua repugnante malevolência, sua capacidade depreciativa. Nada lhe resiste. Ele não respeita seus amigos e nem mesmo seus inimigos. Nem mesmo a infelicidade ou a causa da infelicidade.
(...)
G. Deleuze - do livro Nietzsche e a filosofia

Um comentário:

  1. Mais surpreendente do que o ressentimento é a incolumidade. Ela passa como um tato que nada toca, um indiferença diferenciada, como se determinado objeto do mundo fosse apenas sua descoberta, ainda que lhe tenha feito parte o produto. O ressentimento, assim como a adoração, passa por fases. As vinganças passam por graus. Nem todos são capazes de distinguir ressentimento de depressão. A depressão tem cunho narcísico, mas se expande em multiplicidades, orgânicas e inorgânicas. Muitas vezes, a depressão é antecedente a qualquer forma estrutural que a denomine. O diagnóstico, neste caso, já uma agressão. A criticidade está intacta e, nas depressões que ainda não são maiores, a realidade é esmagada aos olhos do pesquisador. O problema da INCOLUMIDADE É QUE JÁ NÃO HÁ MAIS PESQUISADOR. Ele se defende sobre tudo não se defendendo sobre nada. E esse estado não é psicótico. Nem tudo que é paradoxal é psicótico, embora a recíproca não seja verdadeira. Já o ressentimento, ele é demasiado pequeno comparado a uma depressão. Ainda assim, o narcisismo, ao contrário da depressão, onde o narcisismo é consequente, no ressentimento o narcisismo é precedente. A vantagem é que ele é circunscrito a determinado evento. Demasiado limitado, pequeno, pobre. Não deve ser condenado por isso. Afinal, quem nunca passou por ressentimentos nunca venceu obstáculos na vida. O problema do ressentimento se dá quando ele se associa à patologia, ainda que a patologia esteja apenas esboçada, isto é, ainda que a patologia ainda não seja patologia.

    ResponderExcluir