quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

QUEM TEM MEDO DA PSIQUIATRIA  BIOLÓGICA?


Enfocando    o grupo técnico  em  saúde  mental, teríamos: 1-Trata-se de  fato  de  um grupo? 2-  A  que  interesses  atende? 3-Que concepções sobre a loucura norteiam  o seu  trabalho?  4-Como se dá a comunicação entre os segmentos técnicos  em relação ao paciente? 5-Qual o lugar da ética e da política nas ações práticas?  Tentaremos   desenvolver   cada  um dos  itens, tendo como hipótese de base: apesar da  reforma psiquiátrica, a psiquiatria  é  um modo de subjetivação que ainda domina e controla os que lidam com o paciente. Existe, pois,  o grupo técnico  trabalhando   sob uma transcendência psiquiátrica. Isso não é  um mal em si, desde que  a psiquiatria oferece um arsenal de medicamentos  contra os transtornos mentais. E há que  usá-los, sem dúvida. A questão é que  esse dado surge  como primeiro  na avaliação clínica. Medicar e depois diagnosticar   (*), se possível. Desse modo, o transtorno mental surge na e da psiquiatria como seu objeto  legítimo. Cabe aos demais  técnicos  acompanharem    o carro-chefe. Ou nada. Esse  fato  compromete  o trabalho de grupo  como um trabalho coletivo. Mais: de que  objeto se trata? Transtorno mental já não seria alguma coisa fabricada pela própria psiquiatria? Ora,  se  é objeto da psiquiatria,  não pode ser objeto da psicologia ou de outros saberes. Então, partir da psiquiatria como  proprietária do paciente é admitir que tudo, em termos de equipe e tratamento, gira   em torno do significante hegemônico “psiquiatria”  como centro de significação clínica. E por extensão o seu objeto, o paciente. Parece  que estamos girando num círculo de redundâncias. Como então constituir um grupo se um  sujeito (a psiquiatria) instituiu  há muito o seu objeto (o paciente) ? A grupalidade só pode ser tentada se houver  uma    des-hierarquização   das relações intra-grupais. Um mesmo plano de trabalho e de afetos. Fora disso,  cria-se uma farsa.   Então, esta é  a primeira condição para um grupo de trabalho em saúde  mental. Todos são iguais em suas  diferenças. Em   segundo   lugar, a que interesses  atende  o  grupo? Pode  ser  o interesse do estado, querendo   suas  aps para justificar a assistência. O  que  mais? O interesse  da  sociedade como um todo e o seu  senso comum para  saber como andam  (e  o que  fazem ) seus  loucos. Ao contrário, acreditamos que o  grupo deve  atender  aos  interesses  da loucura. Entendemos  essa como a conduta libertária avessa aos domínios do estado e  dos  seus aparelhos  conexos. A loucura, na verdade, não tem e não  vive de interesses. Ela vive do desejo, é o puro desejo espraiando-se em produções ao acaso dos encontros. Tal definição alcança o campo do impessoal. Portanto, não falamos do louco, mas da loucura que poderá se encarnar, aí sim, num suposto louco. Em terceiro lugar,  o desejo está em toda a parte onde se trabalha com o louco. Ressoa a questão: que linhas o desejo percorre ou, ao contrário,  estagna  quando  o louco se diz  (ou dizem) que  ele  é louco? Por fim, em quarto lugar, a análise de um grupo técnico compreende  as linhas e as práticas que o desejo percorre. A equipe técnica é composta por linhas de desejo e práticas  que lhe são  co-extensivas. Ela  demanda uma análise político-institucional das  suas operações cotidianas.Para  isso  ser  possível, usamos  um método que  traça a cartografia das produções do desejo num  meio  (ou conjugação)  de  determinações múltiplas. O meio é a subjetividade  como modo de produção contextualizada. O Caps tende a reproduzir o modelo biomédico autor de tantos equívocos  na história da psiquiatria. Talvez por isso, no momento, praticamente não há avanço. Ao contrário, se as pesquisas sobre o cérebro evoluem, o que há é um retrocesso na percepção da vida afetiva. Ora, falar  em grupos é antes   considerar  a sua vida  afetiva: o desejo  como  foco. Os  grupos  se movimentam   pelo desejo. Ou melhor, o desejo é o próprio movimento, não como espaço a ser percorrido, mas  como intensidade. Desse modo, a pergunta : o que move o trabalho dos Caps? O que move  as  suas equipes  (...)

Antonio Moura  

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