segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

SOBRE TRANSTORNOS DA PERSONALIDADE

Excetuando o anti-social  e o  borderline, os demais   não  constituem, em geral,   uma   ameaça à ordem  psiquiátrica. Ao contrário, a psiquiatria os mantém como referência semiológica para um diagnóstico definido ou  a esclarecer.  Nos manuais psiquiátricos as descrições são redundantes, mas permanecem  compondo um capítulo dos códigos dos transtornos mentais ( = doenças mentais).   Mas, que doenças?   Aquelas que menos se parecem com doenças. Neste sentido, o critério   usado para um enquadramento patológico é moral. É onde  a psiquiatria expõe    os  seus instrumentos de poder   acoplados à moralidade vigente. A descrição dos tipos, comparando-se   uns   aos outros    é rasa em argumentos conceituais   e redundante como elucidação de métodos. Dimensional ou  Categorial [1] eles   não modificam a   fundo  a situação  clínica de incerteza  diagnóstica.   Há pacientes que parecem normais. E nem sequer  são loucos “por dentro”, como na paranóia ou no  transtorno delirante persistente. O essencial é que eles  não deliram, não há  angústia, a cognição é íntegra.  Porém,    incomodam  e  fazem sofrer[2].   Certas  personalidades   incomodam   desde que suas características  destoem dos códigos sociais.  No entanto, muitas  se configuram  nos próprios códigos   e se encaixam numa atividade laboral, num contexto  relacional  amoroso, numa inserção institucional de poder,etc. Um tipo obsessivo atuando no serviço burocrático, um  paranóide desempenhando  investigações na polícia federal, um dependente  pendurado num casamento,  e assim    por diante.   Pode-se   dizer que em   grande parte os atributos dessas personalidades  tornam-se  úteis   ao funcionamento social, não deixando qualquer vestígio de anormalidade ou patologia (...)

Antonio Moura - do livro Trair a psiquiatria

[1] São dois métodos usados para avaliar os TP. O categórico estabelece uma base descritiva  nos termos do verbo ser. Acaba remetendo o paciente a uma “essência” da  personalidade.  O  dimensional relativiza esse dado em prol de uma avaliação por grau de alteração: mais histriônico ou menos histriônico, por exemplo. No entanto, ambos os métodos trabalham sobre o frágil conceito de personalidade.
[2] Schneider define os TP como aqueles que sofrem com sua anormalidade ou fazem sofrer a sociedade. Ora, a clínica nos mostra que a segunda opção é muito mais encontradiça...

Nenhum comentário:

Postar um comentário