*Você tem uma formação científica, depois escolheu a filosofia. Certa vez sustentou que a química lhe ensinou a arte da mesclagem, assim como Deleuze lhe ensinou a arte do encontro. Disto você deduziu um modelo para a ciência. Gostaria de saber que modelo apresenta hoje para a política.*
Resposta - Para entender a relação ente filosofia, ciência e política é preciso acima de tudo subtrair-se ao exercício da autoridade. Não me interessa introduzir uma hierarquia nas relações entre as práticas políticas e científicas e, por conseguinte, um princípio de ordem ou um equilíbrio estático, que impedem o devir de tais práticas. Trata-se, ao contrário, de estabelecer uma ecologia entre as práticas científicas, algo que eu defini nos termos de uma farmacologia. Com respeito à nossa tradição filosófica e científica, queodeia toda forma de mesclagem e considera os fenômenos somente de maneira clara e distinta, creio que é preciso adotar esta perspectiva. Este conceito foi introduzido por *Jacques Derrida*, o qual explicou que a escritura é um pharmakon, uma forma de dosagem da loucura. Eu prefiro usar pharmakon no sentido tradicional, aquele da medicina. Na nossa tradição, desde *Platão*,os pharmaka, estas coisas perigosas que requerem uma arte da dosagem, têm sido desqualificados em benefício dos princípios que garantem o bem e verdade. A arte da dosagem obriga, ao contrário, a encontrar uma nova relação entre práticas científicas e práticas não científicas. Ela ensina que as coisas não se dão jamais de maneira boa ou má, racional ou irracional. Eu o entendi quando trabalhei, primeiro na Holanda, depois na França, com as associações de auto-ajuda dos consumidores de drogas.Encontrei-me ante um evento que investe tanto na política como nos saberes científicos. Não é possível pensar seu papel na sociedade sem pôr-se o problema democrático por excelência: a produção ativa de saberes da parte dos grupos que se empenham politicamente a partir da própria situação.Nestes casos, os cientistas e os experts têm sido obrigados a negociar politicamente o uso dos próprios saberes com os grupos interessados. Esta negociação tem sido o resultado de uma inteligência coletiva que é a forma ideal em que o *pharmakon* é usado. Ela permitiu conectar-se com outras idéias e outras práticas, experimentando novas conexões além das hierarquias existentes entre as práticas.
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