Neurocirurgião mata o plantão e deixa menina com bala na cabeça
Elio Gaspari, O Globo
O neurocirurgião Adão Crespo, do Hospital Salgado Filho, do Rio, faltou ao serviço no dia de Natal. Por isso, a menina Adrielly dos Santos, de 10 anos, ficou oito horas esperando por atendimento adequado. Tinha uma bala na cabeça.
Chamado à polícia, informou que faltava aos plantões há um mês, porque discordava da escala de serviço.
Segundo o doutor, uma determinação do Conselho Regional de Medicina manda que haja nos hospitais públicos dois neurocirurgiões por plantão. Como escalavam-no sozinho, não ia. Lindo.
O Cremerj determina que os plantonistas sejam dois, e o neurocirurgião decide que é dois ou nada, passa o dia de Natal em casa e Adrielly fica com a bala na cabeça.
Vale registrar que é uma temeridade botar um caso como o da menina nas mãos de um só neurocirurgião. Seria necessário que no plantão houvesse pelo menos um residente para assisti-lo.
Bingo: o sistema público do Rio não tem mão de obra para respeitar essa necessidade.
Se o doutor Crespo, ou qualquer outro, quer se rebelar contra a má qualidade dos serviços públicos de saúde, tem dois caminhos: pede as contas ou usa o seu tempo disponível para infernizar a vida do prefeito Eduardo Paes, do governador Sérgio Cabral, do ministro Alexandre Padilha e da doutora Dilma.
Pode até protestar contra o papa, mas não pode faltar ao serviço, nem se defender na polícia com o manto branco do corporativismo médico.
Crespo e todos os seus similares deveriam ser convidados a preparar uma biografia de um colega: Antonio Ribeiro Netto.
Durante mais de 40 anos, até sua morte, nos anos 90, foi cirurgião de tórax do Hospital Souza Aguiar. Lá, o CTI da neurocirurgia chamava-se "Coreia". Não sabia quanto ganhava. Quando se aborrecia com as questões do cotidiano, ia para o hospital adiantar procedimentos cirúrgicos.
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