E AGORA?
(...)
E nós caímos na vida cotidiana, que para muitos é tão difícil e arriscada como uma Olimpíada. Depois de uma certa idade, então, cada corrida, cada salto, cada longa caminhada é celebrada como um recorde. Mas o mais importante é perceber que começou de novo o jogo cotidiano. Vamos ter os forças federais até quando? Se ficarem, o que fazer para assegurar que sua saída não cause danos? Há um problema adicional que poucos notaram: a campanha eleitoral começou. Não vi ainda candidatos no meu caminho. Mas sei que existem e que, daqui a pouco, sorridentes e com as mãos estendidas, virão propor soluções fáceis para os intrincados problemas de sempre. Antes da operação Lava-Jato, as campanhas já pareciam irreais. Agora, depois de tudo revelado, a distância entre o discurso dos políticos e a realidade das pessoas deve provocar inúmeros curto-circuitos.
Não se trata apenas de uma operação que desvendou os meandros da organização criminosa no poder. Em 2013, as pessoas já pressionavam por serviços públicos decentes; em 2015, pelo impeachment de Dilma. Em termos puramente subjetivos, o Brasil mudou muito nos últimos anos. A Olimpíada foi produto de um delírio do passado, realizado com os pés no chão na aspereza do presente. Como disse o técnico francês ao “Le Monde”, o Brasil é um país estranho, mágico. Vivo nele há muitas décadas para saber que por baixo da cortina de exotismo alguns problemas sobrevivem a todos os orixás, santos e pajés. Quando ouvi um locutor satisfeito porque o lixo da Baía de Guanabara foi para o fundo, num dia de regata, pensei: se apenas os estrangeiros acreditassem na magia brasileira, seria mais fácil.
É tempo de eleições, e os mágicos virão com todos os truques, lenços desaparecem, coelhos saem da cartola. Os políticos não inventaram o Brasil. Apenas exploram alguns pontos fracos.
Fernando Gabeira,21/08/2016
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