O remédio compõe a paisagem dos consultórios. Ele expressa o olhar direto do psiquiatra. Antes mesmo de ver o outro, o olho do significante absoluto empreende o ato de medicar antes de viver e decifrar um fascies. A aparência não aparece. O remédio é uma arma tornada amena e humana em mãos prescritivas e rápidas. Nada contra a sua eficácia comprovada em experimentos insuspeitos. Trata-se de outra coisa: o desejo. O fármaco lamina formas de vida. Ao que tudo indica, ele chega pronto para a ação bioquímica e definitiva. O outro, o traste humanizado em nome do paciente, o próprio. Remediar a condição humana, quem não tentou? Somos prudentes no ato de medicar. A hora da alienação consentida domina as mentes, inclusive as do último ouvinte da loucura. Afastamo-nos da demanda criada pelo fármaco salvador. Isso livra a concepção racional da diferença e a substitui pela alegria: universo de potências múltiplas. Ora, o fármaco tripudia das mentes inferiorizadas pelo sistema dos valores de troca. Um coração fenece, sempre que a dobra do tempo incide sobre o ser imóvel. Ao contrário, use a posologia dos afetos. Palavras técnicas dão lugar a vôos baixos. Vamos no rumo da mais louca abstração. Espécies esquecidas. Lovecraft.
Antonio Moura
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