SINGULARIDADES
(...) (...)Usamos o conceito de vivência articulado aos problemas da clínica psicopatológica. Esta se compõe de linhas do desejo (afetos) e linhas do pensamento (crenças). Assim, o paciente, antes de tudo, sente e acredita. Sua vivência observada na clínica não é A vivência, mas uma vivência ou vivências que se expressam em signos nem sempre significantes. Tal perspectiva faz do exame psíquico um Encontro, podendo este ser bom ou mau a depender dos afetos e das crenças postos em jogo. Isso requer do técnico entrar em contato muitas vezes com um mundo que compreende algo incompreensível à consciência. Afeto e pensamento, desejos e crenças são territórios existenciais que fazem viver. As vivências são singularidades.
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A.M.
Falemos da subjetividade. Outro exemplo. Por exemplo, na experiência da leitura do Deleuze, percebo traços EXISTENCIALISTAS. Ora, essa maneira de ser afetado, essa percepção que surge dessa EXPERIÊNCIA, além de estar completamente FORA do eixo acadêmico e só poder ser percebida FORA dele, presume uma influência da SENSIBILIDADE. No quesito da subjetividade, para tornar essa percepção comunicável, mesmo que essa comunicação não seja uma deliberação "consciente" do próprio sujeito, faz-se necessário submetê-la à apreciação acadêmica: portanto, regras da ABNT, regime de pesquisas e provas, debates com professores mais experimentados no Deleuze e por aí vai. Afinal, o próprio Deleuze diz, em Empirismo e Subjetividade, na p. 94, que "é esta a dupla potência da subjetividade: crer, inventar; presumir os poderes secretos, supor poderes abstratos, distintos. Nesses dois sentidos, O SUJEITO É NORMATIVO: ELE CRIA NORMAS OU REGRAS GERAIS". Existe algo mais transparente do que isso?
ResponderExcluirFalemos agora (e por último) dos afetos, em contraposição à subjetividade. Quero seguir a mesma linha da transparência e deixar claro porque sustento a diferença e porque se deve abrir mão de se trabalhar com a subjetividade. Antes perceba a sutileza: ABRIR MÃO DE TRABALHAR COM A SUBJETIVIDADE NÃO É O MESMO QUE ABRIR MÃO DE TRABALHAR A SUBJETIVIDADE. Acho o exemplo de Kafka fenomenal porque, mesmo o Deleuze, se passa nele. Tentando dissertar sobre o devir como um reflexo da subjetividade, isto é, o movimento, Deleuze se centra na questão da forma-Inseto. Gregor "devir-outro", devir-inseto, tornou-se um inseto, que não é um inseto propriamente dito nem ele próprio, mas uma terceira forma, portanto. No afeto, processa-se algo semelhante, mas de natureza totalmente adversa. Ou seja, no afeto, há uma "terceira" transformação, digamos, porém, sem interessar os personagens. Há uma mudança de foco para a colocação de um problema. Nesse sentido, Kafka questiona a invulnerabilidade do homem elevando o ABSURDO à potência que excede todos os limites. É nessa medida que digo: A BARATA É UMA BARATA QUE ACOPLA-SE AO GREGOR. E é realmente isso que afetivamente se passa, porque não há sujeitos em questão, o foco não está no sujeito. Na perspectiva do afeto, o devir e a subjetividade não são descartados, e sim DESLOCADOS para o aspecto SOCIAL, logo, INSTITUCIONAL. Ou seja, o fato de Gregor ser obrigado a se tornar um "caixeiro-viajante" para sustentar as finanças da família o levou à transformação em um terceiro elemento, qual seja a SUBVERSÃO do próprio trabalho: "Numa manhã, Gregor acordou para o trabalho transformado em um inseto horrível."
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