sexta-feira, 27 de julho de 2012

SEM  CULPA

(...) (...) Considerando  por  partes, o psiquiatra  sofre o efeito  de várias máquinas. Primeiro, claro, da  própria  psiquiatria.Depois, formando  uma teia  ou  uma  trama de contornos  imprecisos  da medicina, do estado, da academia, da ciência, da pesquisa, do emprego, do  mercado, do dinheiro, da produção, da escola, do direito, da polícia, da moral e  do eu. Esta  não  é  uma lista exaustiva. Serve  apenas  para  pontuar o fato  de que a  pessoa do psiquiatra  não está presente na clínica  como “razão individual” ou “consciência”, mas como peça constitutiva de um agenciamento coletivo. Daí, a ênfase no seu “sofrimento” não como  um afeto  necessariamente  ruim, mas como pathos. O psiquiatra sente e não precisa  dizê-lo (está implícito) mas é preciso torná-lo real mediante o ato  clínico. E  o faz  com  a   força motriz  das suas  capacidades  técnicas  aplicáveis  a cada situação. Não se trata,  pois, de interpelá-lo como pessoa,  indivíduo, pois ele  apenas  repete o script  da palavra de ordem  que aciona  a psiquiatria desde  o seu nascedouro:“este  homem é louco? caso seja, controle-o!” Assim,  sente  o efeito  das produções  desejantes que se conjugam  num eu pronto a  sacar o  remédio  químico. Não  sofre  por  isso (nenhuma  culpa)  e  não  sofre ao  receber ordens implícitas para fazer isso.Nada a ver com  os escrúpulos da  consciência. 
(...)
A.M.

2 comentários:

  1. Disse "Pilatos", mas não expliquei. Antes que se interprete como uma ofensa pessoal, Pôncio Pilatos foi UMA ESPÉCIE DE JUIZ que condenou Jesus Cristo à cruz, mesmo não tendo encontrado nele nenhuma culpa. Percebam que aqui há todos os elementos necessários para a análise do discurso. Em primeiro lugar, Pilatos é um homem do poder e, como tal, não quer "largar o doce", não quer se comprometer, entretanto e pelo menos, PILATOS NÃO PROPÕE UM DISCURSO NIETZSCHIANO. Em segundo lugar, ele é um prefeito, prefeito da Judéia, mas uma ESPÉCIE DE JUIZ, porque o que ele diz é exatamente o que foi postado aqui nesse blog, como uma crítica. Vejam só que absurdo! A postagem se referia a um dizer de Michel Foucault sobre as "funções do juiz". E, ao mesmo tempo que isso foi postado, como crítica, o discurso promovido é o mesmo do juiz: "Eis aqui o louco que vocês querem e pedem que eu controle." Terceiro e último lugar, ninguém falou aqui em consciência, nem em pessoa, e sim em agenciamentos coletivos mesmo, aliado a outros agenciamentos, mas não enquanto fundamento de uma prática HUMANISTA. Engraçado, mais uma vez, engraçado. Critica-se tanto o HUMANISMO, mas o que se diz é exatamente: "Faça sua prática no dia a dia, ali com o paciente, drible a psiquiatria, etc., etc." Um discurso HUMANISTA, uma vez que APOSTA NO SER HUMANO (TÉCNICO) e no seu cotidiano de trabalho com o paciente na melhora dos serviços, da saúde mental, enfim, do que se queira objetivar. O dizer "sem culpa" só confirma o "Pilatonismo", porque foi exatamente o que Pilatos fez diante de Jesus, que pode muito bem representar um louco. Pilatos diz: "Vocês querem condená-lo e eu não encontro nenhum motivo para condenar este rapaz, entretanto, imerso em dispositivos institucionais e cumprindo a minha obrigação, eu retiro a minha culpa e cumpro a minha obrigação." É exatamente do que se trata.

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