SOBRE O MÉTODO DA DIFERENÇA - EXCERTO 2
(...) (...)O psiquiatra se despersonaliza. Torna-se algo que se torna outra coisa. Vive nos e dos paradoxos da linguagem que o empurram a encontrar o paciente, o mundo, o cosmos. Não compreende o que se passa. Perplexo, interroga e interroga-se. Dança e entoa em silêncio cânticos extraídos do fundo de vielas existenciais. Não busca uma ontologia da psicose e/ou dos transtornos mentais. Ele talvez consiga ser um feiticeiro da modernidade técnica, criando linhas de pura alegria (ainda e principalmente) nas quedas e surtos dos pacientes e de si mesmo. O método da diferença traz essa possibilidade para o interior da clínica. Os fármacos podem (claro que sim!) ser parceiros numa empreitada sem signos prévios. Use e controle essa droga lícita, sabendo que ela pode se tornar ilícita se atentar contra a criatividade do seu viver. Não só a química, mas todo e qualquer objeto pode induzir a uma dependência abjeta. O psiquiatra-feiticeiro não é esse objeto. O psiquiatra remedeiro, sim. Este se alimenta de subjetividades enrijecidas, esvaziadas, ocas, trastes apelidados de pacientes. É preciso, pois, um combate incessante contra a máquina farmacológica. O fármaco é apenas um elemento prático-terapêutico. Um devir-feiticeiro conta com outros elementos: a sensibilidade, a intuição, a percepção do invisível,o senso de observação, a escuta do silêncio, a espreita, todo um conjunto de dispositivos...
(...)
A.M.
Entrevista
ResponderExcluir- "Eu não entendo você. O que você propõe?"
- "Um trabalho com os afetos."
- "O que são afetos?"
- "Os afetos são linhas pré-emocionais, inomináveis e imperceptíveis, evidenciados, enquanto método, por Spinoza."
- "Como acessá-los?"
- "Não há resposta para esta pergunta. É justamente por esse motivo que cabe o trabalho com eles."
- "Como trabalhar com aquilo que não se acessa?"
- "É o trabalho com a loucura. É justamente isso. É o desafio diário."
- "Mas, alguma metodologia você tem que ter, não é? Senão o trabalho fica solto..."
- "É justamente aqui que entra a intuição como método. Você me fez uma pergunta acadêmica e lamento por ter que dar uma resposta não-acadêmica. Quero dizer, a intuição como método não é exatamente o que o Deleuze diz a partir de Bergson ou o que Bergson diz sobre intuição, embora a leitura desses autores seja imprescindível. A construção parte de como eles me ajudaram a pensar e, para isso, você precisa fazer o método inverso do acadêmico. No método acadêmico, você já tem o problema pronto e diversas pessoas já catalogaram métodos, bastando você escolher dos métodos disponíveis o mais adequado. Nessa perspectiva que proponho, "você precisa saber o que quer" e este "saber o que quer" não é egóico. É uma questão de vida. Antes de responder à pergunta essencial da intuição, que é como colocar um problema, você deve ter em mente um caminho, um traçado, que pode ser abstrato (uma idéia) ou concreto (algo baseado em sua história de vida). Não adianta ficar lendo esses autores sem essa resposta, porque você vai sentir como se estivesse voando em um mar abstrato e de conceitos. Nem adianta olhá-los pela perspectiva acadêmica, senão você nada vai criar. Vai passar a vida tentando entender os conceitos. Às vezes, mesmo não compreendendo algumas coisas muito bem, é uma questão de arriscar a partir do que você viveu, sentiu ou compreendeu."
- "Continuamos na próxima."
- "Ok."